Jesus, O Médico da Alma.
Autor: Fabiano Pereira Nunes
Artigo publicado na REVISTA CULTURA ESPÍRITA, do Instituto de Cultura Espírita do Brasil, ano III, n. 33, dezembro de 2011, p. 16.
Nada obstante, será na singular abordagem de Jesus às doenças da alma humana que encontraremos a mais excelente demonstração de superioridade intelecto-espiritual.
Observaremos, por exemplo, que estando Jesus na casa de Levi (1) vieram muitos publicanos e pecadores, que se assentaram à mesa com Jesus e seus discípulos. Naquele período histórico, os publicanos constituíam uma das classes sociais mais detestadas pelo povo Hebreu, em virtude de serem os rendeiros públicos responsáveis pela arrecadação de impostos, a serviço do Império Romano. Frequentemente, exorbitavam da tributação com ganância inescrupulosa, e para agravar a situação, esse pagamento de impostos constituía uma afronta às Escrituras Sagradas. Por tais motivos, eram considerados pelos Israelitas como traidores execráveis. Os fariseus (2), notando que Jesus partilhava amizade e afeto com homens “impuros”, perguntaram aos Seus discípulos: "Por que come o vosso Mestre com os publicanos e os pecadores?" O Raboni, ao ouvir o que diziam, respondeu: "Não são os que têm saúde que precisam de médico, mas sim os doentes. Ide, pois, e aprendei o que significa: misericórdia é que eu quero, e não sacrifício. Com efeito, eu não vim chamar justos, mas pecadores"(2).
Em ímpar combinação de compaixão, coragem e caridade, Jesus inovara o entendimento da problemática da viciação moral, interpretando-a como enfermidade que carece de atenção, identificação e cuidados especiais, e situando-a como o principal fator causal da infelicidade do homem. Notável presciência do Excelso Médium de Deus, posto que, modernamente, as ciências médicas lograram novas elucidações para o drama da viciosidade moral.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, cerca de 25% dos pacientes consultados por médicos clínicos-gerais apresentam transtornos psiquiátricos em atividade. E ocupando lugar de grande relevância no cenário das disfunções psíquicas estão os Transtornos de Caráter (3).
Difíceis de reconhecer - e de diferenciar dos traços não patológicos da personalidade - os Transtornos de Caráter caracterizam-se por padrões disfuncionais de cognição (percepção e entendimento) e de emoções ao lidar com as situações cotidianas da vida, acarretando um modelo de comportamento altamente perturbador, nocivo, repetitivo, com consequente ruptura das relações interpessoais e sociais do indivíduo.
Dentre os padrões patológicos de comportamento que caracterizam os diferentes tipos de Transtornos de Caráter(3) encontraremos: desconfiança e suspeição paranoicas; afastamento das relações sociais, com faixa restrita de emoções; comportamento excêntrico com desconfortos agudos e instabilidade no relacionamento íntimo; desrespeito aos direitos dos outros, compulsão em prejudicar ou magoar as pessoas; instabilidade na percepção da autoimagem, inibição social e hipersensibilidade à avaliação negativa de outrem; hiperatividade emocional, comportamento teatral e sedução; grandiosidade persistente, falta de empatia e excessiva necessidade de admiração; comportamento nocivamente submisso e aderente; rígida e intransigente preocupação com detalhes desnecessários.
Como os pacientes portadores dos Transtornos de Caráter não estão conscientes de suas enfermidades, o reconhecimento e tratamento dessa moléstia são bastante difíceis. A psicofarmacologia não está indicada nesses distúrbios, sendo a terapêutica mais atual a psicoterapia interpessoal, objetivada em fazer o paciente tomar consciência dos padrões comportamentais nocivos, dos seus impactos pessoais e sociais, assim como em aprender a dominar essa conduta.
O Espiritismo, em sua condição de cristianismo da idade moderna(4), é a nova ciência(5) que veio revelar aos homens, com provas irrecusáveis, a existência e a natureza do mundo espiritual e as suas relações com o mundo corporal, desvelando os conhecimentos que edificam uma aliança entre as ciências e a religião(6). Descortinando um novo ponto de vista (7) – o da vida futura, espiritual, eterna e evolucional – revoluciona a maneira de se encarar a existência, as vicissitudes e os valores humanos. Por conferir, pelo entendimento das Leis Divinas, lucidez, resignação e fé racional, dá ao espírito os instrumentos necessários para resistir aos vícios, se constituindo, ainda, num poderoso preventivo contra as doenças morais, e as doenças mentais (8), sendo, por conseguinte, formidável adjuvante da ciência para o enfrentamento do drama dos Transtornos do Caráter.
Portanto, ao confrontarmo-nos com os desafios das doenças do corpo e da mente, recorramos sempre ao Amigo Fiel, assim como às ciências médicas e ao espiritismo, que são os instrumentos que o Sublime Médico da alma humana se utiliza para nos amparar e educar.
2. BÍBLIA. Português. Bíblia de Jerusalém. Nova edição rev. e ampl. São Paulo: Paulus, 2002. 3 a. Impressão: 2004. O Evangelho Segundo Mateus 9:10-13 p. 1719
3. SCHIFFER, R. B.: Os Distúrbios Psiquiátricos na Prática Médica. In: Cecil Medicina, editores AUSIELLO, D; GOLDMAN, L. 23. Ed. Tradução de Adriana Pitella Sudré, et al. Rio de Janeiro: Elsevier. 2009. Seção XXV, cap. 420, p. 3038-50.
4. KARDEC, Allan. A Revista Espírita. Jornal de Estudos Psicológicos. Ano sexto, novembro de 1863. Tradução de Evandro Noleto Bezerra. 3. Ed. Rio de Janeiro: FEB, 2006. p. 476.
5. Idem. O Evangelho Segundo o Espiritismo. Tradução de Albertina Escudeiro Sêco. 5. Ed., Rio de Janeiro: CELD Ed, 2010. Cap. I, item 5. p. 54.
6. Idem. Ibidem. Cap. I, item 8. p. 55-6.
7. Idem. Ibidem. Cap. II, item 5. p. 66-8.
8. Idem. O Livro dos Espíritos. Tradução de Maria Lúcia Alcântara de Carvalho. 2. Ed., Rio de Janeiro: CELD Ed, 2011. Introdução ao Estudo da Doutrina Espírita, Item XV. p.51-52.